quinta-feira, 12 de março de 2009

Igreja, Aborto e Excomunhão

Por Dr. e Prof. José Fernando Ribeiro Carvalho Pinto


Novamente ganha ampla repercussão a questão do aborto, ante o crime de estupro ocorrido em Recife (PE), onde uma menina de apenas nove anos ficou grávida, procedendo-se, sem seguida, ao aborto.

O episódio ocorre no momento em que a Campanha da Fraternidade traz como lema “A Paz é Fruto da Justiça”, cujo tema assenta-se na questão da Fraternidade e Segurança Pública.

Diversas vozes se levantaram em face da entrevista concedida pelo Bispo de Recife, afirmando que os praticantes do aborto foram excomungados da Igreja, criticando tal postura da Igreja Católica.

Entretanto, há fundamento jurídico, a nosso sentir, além, evidentemente, do fundamento Cristão, moral e ético, de que a prática do aborto é vedada. Seja pela Lei Divina, seja pela Constituição Federal.

O direito a vida prevalece sobre qualquer outro direito. É direito natural por excelência, princípio sobranceiro na Constituição Federal de 1988, constante, também, das Declarações Universais dos Direitos do Homens, sem o qual não há cogitar de mais nada, inclusive da dignidade, pois dignidade pressupõe vida.

A Constituição consagra, em seu artigo 5º, que estabelece acerca dos direitos e garantias fundamentais, o DIREITO À VIDA. Não é como a Constituição anterior (de 1967), que assegurava os direitos inerentes à vida. Nessa Constituição de 1988, o direito sagrado e divino à vida é que é protegido, é garantido.

Sustento, conquanto existam posicionamentos diametralmente opostos – o que a sociologia denomina de desacordo moral razoável - que qualquer decisão que permita o aborto violará a Constituição Federal, que considera inviolável o direito à vida.

A prática do aborto também fere o § 2º do mesmo artigo, que oferta aos tratados internacionais de direitos humanos a condição de cláusula imodificável da Constituição, possuindo “status” de supralegalidade (decisão do Supremo Tribunal Federal, guardião da CF). Viola o artigo 4º do Pacto de São José, tratado internacional sobre direitos fundamentais a que o Brasil aderiu, e que declara que a vida começa na concepção.

A mesma Constituição, no artigo 227 assegura que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida...

E encontraríamos, sem dificuldade, um sem-número de impedimentos de ordem constitucional para o aborto.

No caso do aborto, não há vida a defender. Há, sim, morte de uma vida sem defesa.

Jacques Robert: asseverava que \'O respeito à vida humana é a um tempo uma das maiores idéias de nossa civilização e primeiro princípio da moral médica. É nele que repousa a condenação do aborto, do erro ou da imprudência terapêutica, a não aceitação do suicídio. Ninguém terá o direito de dispor da própria vida, a fortiori de outrem e, até o presente, o feto é considerado como um ser humano.\".

No caso de Recife, o Arcebispo Dom José Cardoso Sobrinho não aplicou a pena de excomunhão aos que praticaram o aborto, mas sim lembrou que a previsão contida no Código de Direito Canônico (cânon 1398), que prevê a excomunhão automática nesses casos. Não foi o Sr. Arcebispo que excomungou.

É preciso lembrar em que consiste a excomunhão. Trata-se de penalidade grave e significa que a pessoa que cometeu determinado delito está excluída, não está em comunhão com a Igreja. Ou seja, não pode receber os sacramentos se não se arrepender. Não é expulsão da Igreja para sempre.

Em artigo recente publicado , o Dr Cláudio Fonteles, Ex-Procurador Geral da República, lembra que a mulher e o embrião, ou o feto, se já alcançado estágio posterior na gestação, que está em seu ventre, são as grandes vítimas do cinismo estatal.

Não há liberdade de escolha quando a escolha é matar o indefeso.

O embrião, ou o feto, porque vida em gestação, mas, repito, vida-presente não se lhes permite a interação amorosa, já plenamente, ainda que no espaço intra-uterino, com sua mãe, e com os demais, caso esses não adotem a covarde conduta do abandono da mulher.

O Estado brasileiro consolidou em seu ordenamento jurídico \"mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher\", editando a lei nº. 11.340/06 conhecida como a lei \"Maria da Penha\".

- A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências: centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar; casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar; programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar (art. 35, I, II e IV)\".

Ora, se assim o é, justamente para que a integridade física da mulher seja protegida, por que, cinicamente, o Estado brasileiro detém-se aqui e, em relação à mulher, que está grávida, que acolhe em si a vida, estimula-a a matar, também a abandonando?

Por que o Estado brasileiro, repito cínico, pela omissão e pela frouxa, errônea e irresponsável justificativa de inserir-se o tema na órbita privada, não tira, como tirou o tema da violência doméstica, portanto também privada, dessa estrita órbita e à mulher gestante não lhe oferece todos os mecanismos oferecidos à mulher fisicamente agredida, para que, assim claramente amparada a mulher, em ambas as situações tenha o direito de viver e fazer viver a vida que consigo traz?

Também em recentíssimo artigo , o Juiz Federal Roberto Wanderley Nogueira, lembra que “(...) não há como flexibilizar o patrimônio da vida em todo o seu esplendor desde a concepção, ou seja, desde quando surgiu no mundo e contra o que se opõem as conseqüências do pecado que deságuam na morte.

A Igreja torna certa e inteiramente visível a misericórdia de Deus, porque não há pecado que seja maior do que a bondade do Altíssimo, razão pela qual pode e deve o pecador, redimindo-se de suas faltas, buscar o perdão em face de sentido arrependimento como tal declarado no Sacramento da Penitência e que se passa a vivenciar daí por diante.

Por outro lado, o fato do Estado Brasileiro ser laico não exclui o fundamento moral contido na ordem jurídica por ele encerrada Isto significa que, por maior que seja a inflexão da lei humana sobre os aspectos fundamentais da vida em sociedade , nela estará sempre presente um núcleo universal do qual ninguém tem o direito natural de afastar-se. E se o fizer sofrerá consequências nefastas, ainda que não haja previsão legal para isso e mesmo que tais consequências somente afetem o interior dos penitentes.

A Constituição brasileira no seu artigo 5º, aliás, protege a vida, incondicionalmente.

Além disso, agrava o acontecimento o fato da rapidez com que se discerniu acerca da interrupção da gravidez da infeliz menor, premida entre a brutalidade de seu padrasto e a indignação de sua mãe, seguida de diversos movimentos organizados, inclusive o governo, que preconizam, absurdamente, a prática do aborto como direito da gestante e como se a vida que ela passa a congregar fosse algo descartável, na ilusão de superar, só por isso, seus conflitos e erros.

Conforme, ademais, houvesse dissensão entre os pais da menor gestante sobre levar ou não a termo a gravidez problemática da menina, não pareceu de modo algum razoável que os procedimentos para o aborto fossem materializados por iniciativa exclusivamente administrativa do próprio Estado, sem ausculta jurisdicional, mediante o cumprimento devido processo legal para verificação das hipóteses preconizadas na própria Lei Penal de regência (art. 128).

Que sirva o presente para fomentar a discussão, para que a sociedade civil organizada, juntamente com os Poderes Públicos se debrucem sobre ações que efetivem direitos desde há muito previstos – Estatuto da Criança e Adolescente, Lei Maria da Penha etc... para a mulher, vítima cruel da violência insana, conferindo-lhe especial proteção e amparo, bem como ao feto, que é vida. Que a Paz seja Fruto da Justiça.

Finalizando, sem fundamento jurídico, sem fundamento filosófico e tampouco religioso; Mas sim poético: Màrio Quintana já dizia: \"O aborto não é, como dizem, simplesmente um assassinato. É um roubo... Nem pode haver roubo maior. Porque, ao malogrado nascituro, rouba-se-lhe este mundo, o céu, as estrelas, o universo, tudo. O aborto é o roubo infinito.

José Fernando Ribeiro Carvalho Pinto
Advogado
Pós Graduado em Direito Educacional
Professor de Direito
FONTE:http://www.cleofas.com.br/virtual/texto.php?doc=OPINIAO&id=opi0444

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