De ofmsantoantonio.org
Por Frei Marconi Lins de Araújo, ofm
A
vida de Santo Antônio continua chamando a atenção de muita gente por esse mundo
a fora. Como nós sabemos, Santo Antônio nasceu numa família rica e importante
de Portugal. Mas logo cedo quis viver o despojamento da vida de Jesus Cristo
junto à comunidade do mosteiro da Ordem dos Cônegos Regulares de Santo
Agostinho. E quando seus parentes quiseram favorecer uma vida mais fácil dentro
do mosteiro de São Vicente de Foras, periferia de Lisboa, mudou-se para o
mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, fugindo assim das facilidades que queriam
para ele.
Mais tarde,
querendo viver uma vida ainda mais radical, passou a seguir o caminho da
pobreza evangélica, na imitação de Cristo, do jeito do Pobre de Assis, São
Francisco. Antônio nasceu para servir! E fez-se servidor da Palavra de Deus que
anunciou não só com sua voz, mas, sobretudo, com seu exemplo.
Vamos conhecer
um pouco da vida deste grande santo franciscano para aprender dele e com ele
seguir Jesus Cristo vivendo o mandamento do amor!
"Nasceu
rico, fez-se pobre"
O tema faz-nos
lembrar a afirmação de São Paulo que diz: “Jesus, embora fosse rico, se tornou
pobre por causa de vocês, para com sua pobreza enriquecer vocês” (2Cor 8,9). E
Santo Antônio, conforme nos conta a história, também nasceu de família rica.
Seu pai Martinho de Bulhões, era cavaleiro do Rei Afonso II de Portugal, e sua
mãe, Maria Teresa Taveira, aparentada com Failo I, o quarto rei das Astúrias.
Seu avô, o conde Godofredo de Bulhões foi o comandante da primeira cruzada,
“guerra santa” dos cristãos contra os maometanos que dominavam a Palestina,
terra onde nasceu Jesus. Também tinha um tio chamado Fernando de Bulhões que
era cônego e diretor de uma escola onde estudavam os filhos dos ricos, dos
políticos e nobres. Nosso santo nasceu em Lisboa no dia 15 de agosto de 1195.
Recebeu na pia batismal, na catedral de Lisboa, o nome de Fernando, que
significa “ousado campeão da paz”. A casa onde nasceu Santo Antônio fica ao
oeste da Sé de Lisboa, muito perto do portal principal. Certamente tinha outros
irmãos. Entretanto somente temos conhecimento seguro de uma irmã, chamada Maria
e que morreu em 1235 no mosteiro de São Miguel em Lisboa como cônega. Ela ainda
vivia quando seu irmão, Santo Antônio, foi canonizado em 30 de maio de 1232.
Logo cedo, Santo
Antônio foi para a escola onde seu tio era o diretor. Por ser filho do
governador, vivia no luxo e na regalia, tinha tudo para buscar a vida e o ideal
dos ricos de seu tempo. Mas quando Deus escolhe e chama alguém, não se pode
fugir de seu caminho, e Santo Antônio fugiu foi da riqueza, da politicagem, da
mentira e bajulação e buscou a felicidade bem longe de tudo isso. Certo dia, já
rapazinho, assim desabafou:
“Ó mundo! Como
você é um peso para mim!
O seu poder é
nada!
Você não passa
de uma varinha fraca.
As suas riquezas
são como uma baforada de fumaça, e os seus prazeres como uma pedra traiçoeira,
na qual a coragem de um homem de bem se afunda”.
“Acolheu
com alegria a sabedoria da Palavra de Deus”
Em Lisboa, o rei
de Portugal Dom Afonso I mandou construir um mosteiro e deu o nome de São
Vicente de Fora. Queria que aquele lugar marcasse a vitória dos portugueses
contra os seguidores de Maomé, que quiseram tomar Portugal. Nessa guerra contra
os maometanos, o avó de Santo Antônio foi muito importante.
Para tomar conta
do mosteiro, que ficava fora da cidade de Lisboa, o Rei convidou os religiosos
chamados Agostinianos, que já tinham um mosteiro em Coimbra, o de Santa Cruz.
Os Agostinianos eram muito estudados, possuíam terras e se relacionavam muito
bem com os nobres, ricos e letrados da região.
Foi para o
mosteiro de São Vicente de Fora que Santo Antônio entra para a vida religiosa,
em 1210, com a idade de 15 anos. Sofreu a resistência de seus pais e parentes
que queriam que seguisse uma outra carreira mais vantajosa de glórias, poder e
riqueza, mas nosso santo tinha escutado o chamado de Deus e manteve-se firme em
sua decisão.
Mas a vida para
Antônio no mosteiro foi difícil, sobretudo porque seus parentes queriam
interferir demais, oferecendo-lhe facilidades e conseqüentemente o interesse
dos cônegos em manter um relacionamento social estreito com nobres e ricos
incomodavam a Antônio. Ele queria uma vida que correspondesse às exigências do
Evangelho.
Assim, dois anos
mais tarde, em 1212, foi transferido para o mosteiro de Santa Cruz e lá
encontrou ambiente propício para seu crescimento humano e espiritual. Dos
Sermões que nos deixou, pode-se concluir que Antônio aproveitou intensamente as
possibilidades de estudo que lhe foram oferecidas em Coimbra. Possuidor
de uma memória extraordinária dedicou-se em especial ao estudo das Sagradas
Escrituras, encontrando para isso mestres dedicados e um mosteiro com uma
biblioteca bem provida, possuindo também as obras de Santo Agostinho, que
inspirava a vida dos cônegos agostinianos.
Nosso santo fez
das Escrituras aquilo que o salmista já afirmara: “Tua Palavra a é luz para os
meus passos”. Nas Escrituras encontrou a verdadeira sabedoria que está na vida
de Jesus Cristo que “é poder de Deus e sabedoria de Deus” (1Cor 1,24).
“Partiu
para os desafios do mundo”
Não se pode
negar a importância que teve para Antônio a passagem pelos mosteiros dos
agostinianos, tanto em Lisboa quanto em Coimbra. Dificuldades
não faltaram, mas também as oportunidades para uma formação espiritual e
teológica que o firmaram na fé e no amadurecimento para futuras decisões são
inegáveis. E o nosso santo tem consciência disso e sabe ser agradecido àqueles
que o ajudaram a percorrer esse caminho. Mas a vida no mosteiro de Santa Cruz
estava limitada demais para alguém que se caracteriza pela “inquietação
evangélica”. E essa inquietação aumenta quando chega a Portugal, no ano de
1217, o sopro renovador e missionário do movimento religioso iniciado por
Francisco de Assis, e que nem tinha dez anos de existência. Os franciscanos
estavam presentes em Coimbra e em Lisboa.
O modo de vida,
marcado pela pobreza, simplicidade e proximidade do povo marcava a presença dos
irmãos menores. Dois anos mais tarde, em 1919, São Francisco enviou em missão
entre os maometanos cinco frades, Berardo, Pedro, Oto, Adjuto e Acúrsio. Foram
anunciar o evangelho entre os sarracenos em Servilha, Espanha, dominada por
eles. Lá foram condenados à morte, mas receberam indulto de liberdade e
expulsos do país. Mas insistentes foram para o Marrocos e lá sofreram o
martírio, sendo decapitados no dia 16 de janeiro de 1220. Seus corpos foram
levados para Portugal e sepultados no mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, onde
morava Santo Antônio.
O testemunho dos
frades mártires e a proposta de vida evangélica lançada por Francisco de Assis
a toda a Igreja, mexeu com Antônio que pediu para sair do mosteiro e ir para o
Ordem dos Frades Menores. Foi difícil receber a autorização do superior mas
Antônio conseguiu. Diz-se que um dos cônegos despediu-se de Antonio dizendo,
certamente com ironia: “Vai, pois, vai, agora podes enfim tornar-te santo!”
Também dizem que Antônio respondeu: “Se acaso ouvires alguma vez que eu me
tornei santo, então louva o Senhor Deus”. Tinha razão, Antônio será o “santo do
mundo inteiro” e vai se santificar no contato diário com as pessoas,
ajudando-as a encontrar em Deus o sentido para viver e para enfrentar os
desafios da vida. A vida de Antônio não foi fácil, mas jamais procurou as
facilidades deste mundo, sabia que o caminho do Senhor é estreito e é nele que
caminhamos para a verdadeira felicidade.
“Firmou-se
na virtude da humildade”
Foi em 1220 que
Fernando saiu do mosteiro agostiniano e entrou na Ordem franciscana. E como o
conventinho dos frades em Coimbra tinha como padroeiro o eremita Santo Antão,
foi esse o nome que Fernando recebeu agora como frade menor: Antônio. O costume
de mudar o nome tem fundamento bíblico e quer significar começo de uma nova
vida, com uma nova identidade. Logo Antonio manifestou o desejo de ser
missionário no Marrocos, mostrando assim que o exemplo dos cinco mártires
franciscanos marcou profundamente a sua vida.
Pelo fim de 1220
recebeu a licença de seus superiores e partiu para o Marrocos em companhia de
outro frade de nome Filipe. Chegou ao Marrocos, mas adoeceu de uma doença
febril por um longo período no ano de 1221. Foi aconselhado a voltar para a
terra natal e na viagem de regresso, mesmo não sendo tempo de tempestades, um
forte vento arrastou o barco para a costa da Sicília, Itália, ao invés de ir
para Espanha ou Portugal.
Acolhido pelos
frades em Messina, na Sicília, foi compreendendo os caminhos misteriosos da
vontade de Deus e humildemente submetendo-se à Sua vontade.
No fim de maio
de 1221, Antônio participou do Capítulo geral da Ordem, em Assis, vindo a conhecer
São Francisco. Após o Capitulo, Antônio é designado para morar no norte da
Itália. No conventinho de Monte Paolo, viveu uma vida de recolhimento e também
assumiu as tarefas de lavar a louça e limpar o chão.
Neste contexto
de vida de oração e trabalhos humildes é convocado para receber a ordenação
sacerdotal, em 1222. E é justamente na festa de ordenação, na hora da refeição
festiva que é convocado pelo superior para fazer uma pregação improvisada. Sua
pregação impressionou a todos e a partir daí, foi designado para a atividade do
apostolado e da pregação.
Antônio
experimenta na própria pele a palavra do Senhor no Evangelho: “Quem se eleva
será humilhado, e quem se humilha será exaltado” (Lc 14,11).
Para quem
pretendia ser mártir no Marrocos e teve de tomar caminhos tão diversos, entende
que a vontade de Deus só pode ser compreendida pelos humildes. Daí dizer que “a
humildade é a mãe e a raiz de todas as virtudes”.
“Foi defensor dos oprimidos”
Santo Antônio viveu comprometido só com o Evangelho. Foi o que ele
buscou viver entre os franciscanos que tinham sua Regra de vida que começava
assim: “A Regra e a vida dos frades menores é viver o Evangelho de nosso Senhor
Jesus Cristo, em obediência, sem nada de próprio e em castidade.
Quando uma pessoa tem compromisso só com o Evangelho, torna-se livre para
anunciar o que Deus inspira e denunciar tudo o que está contra a Sua vontade.
Por isso, Santo Antônio foi sempre uma pedra de tropeço para quem andasse no
caminho da injustiça e da opressão aos pobres.
Sua atuação como pregador foi o anúncio da vida em abundância para todos, mas
em especial dos que dela são privados. Também Jesus inaugura sua missão
evangelizadora, segundo o evangelho de Lucas, dizendo: “O Espírito do Senhor
está sobre mim, porque ele me consagrou com a unção para anunciar a Boa Notícia
aos pobres...”(Lc 4,18). Jesus lê e diz que nele se cumpre a palavra de Deus
anunciada pelos profetas.
Santo Antônio, cheio da força da palavra profética de Deus, atacava
publicamente as injustiças e as desordens sociais.
Contra os que exploravam os pobres sempre teve palavras claras. Num de seus
sermões afirma: “Quem aperta uma pessoa pela goela, tira-lhe a voz e a vida. As
posses do pobre são a vida dele, e como a vida vive do sangue, ele deve viver
disso. Se tirares aos pobres seus parcos haveres, estarás a sugar o sangue
dele, estarás a sufocá-lo, e enfim tu mesmo serás sufocado pelo diabo”.
Durante sua vida de pregador, confrontou-se com um rico latifundiário chamado
Ezzelino que, inclusive, quis matar Santo Antônio.
Outro fato que devemos conhecer é que Santo Antônio conseguiu a anulação de uma
lei que vigorava em Pádua e em muitos lugares da Itália. Essa lei favorecia os
agiotas da época pois punha na prisão perpétua quem não pudesse pagar suas
dívidas. Também os fiadores sofriam o mesmo castigo. Nosso Santo consegue
anular essa lei injusta e no dia 15 de março de 1231, o governo de Pádua
promulga uma nova lei que dizia: “A pedido do venerável irmão santo Antônio,
confessor da Ordem dos Frades Menores, para o futuro nenhum devedor ou fiador
poderá ser privado pessoalmente de sua liberdade quando não puder pagar a
dívida. Somente suas posses poderão ser apreendidas neste caso, não porém sua
pessoa e liberdade”.
Como podemos constatar, Santo Antônio foi grande defensor dos pobres usando a
arma da Palavra de Deus e o testemunho de sua vida.
“Foi mestre da Palavra para seus irmãos”
São Francisco queria que seus frades fossem homens simples, que pregassem a
Palavra de Deus com a força do testemunho e não com a eficiência da sabedoria
aprendida nos livros. Daí sua resistência ao estudo da teologia. Mas sua Ordem
tinha um papel a realizar no meio de tantos grupos heréticos que confundiam a
cabeça do povo e eram ousados na pregação.
Muitos frades já manifestavam o desejo de uma preparação teológica que desse
condições para anunciar com segurança a Palavra de Deus e o ensinamento da
Igreja.
Antônio tinha condições de ajudar os irmãos nesta necessidade. Francisco
compreendeu que era necessário ceder, embora colocando a condição fundamental
para isso: o saber não tem um fim em si mesmo e nem deve ser meio para os
irmãos adquirirem honra e fama perante os homens.
A permissão de São Francisco para Santo Antônio ensinar a teologia vai por meio
de uma pequena carta com o seguinte conteúdo: “Eu Frei Francisco, saúdo a Frei
Antônio, meu bispo.
Gostaria muito que ensinasses aos irmãos a sagrada teologia, contanto que nesse
estudo não se extingam o espírito da santa oração e da devoção, segundo está
escrito na Regra. Passar bem.
Ao chamar Santo Antônio de “meu bispo”, São Francisco quer indicar que a missão
de Antonio se parece com a do bispo que na diocese é, por excelência, o
administrador e distribuidor da Palavra de Deus.
Sabemos pouco sobre a atividade de Santo Antônio como professor de teologia!
Mas os esquemas de seus sermões que ainda hoje nos encantam, nasceram nesta
ambiente de ensino e certamente a pedidos dos frades que queriam aprender a
partir daquilo que Santo Antônio falava ao povo.
Um dos primeiros frades a escrever a vida de São Francisco, Frei Tomás de
Celano, assim se refere à presença de Santo Antônio no Capítulo da Ordem dos
Frades Menores do ano de 1221: “Estava participando do Capítulo também Frei
Antônio, a quem o Senhor abrira a inteligência para compreender as Escrituras,
e que falava de Jesus a todo o povo com palavras mais doces que o mel e o favo”
(1C 48).
E Antônio não decepcionou São Francisco, pois, ensinou aos frades a sagrada
teologia somente para cultivar o gosto pela Palavra de Deus e iluminar a vida
com a luz radiante da Palavra eterna que é o próprio Jesus.
“Foi profeta dentro de casa e no mundo”
Santo Antônio percebia que o surgimento de tantos movimentos
religiosos em sua época e que terminavam na heresia, era causada, em grande
parte, pelos próprios representantes oficiais da Igreja. No meio do clero não
eram poucos os que relaxavam em suas obrigações pastorais e o mau exemplo de
vida escandalizava os fiéis.
Falava Santo Antônio: “Os sacerdotes da Igreja não possuem a luz
da sabedoria nem tampouco as verdadeiras virtudes no modo de agir, de maneira
que o diabo dispersa as ovelhas e o ladrão, isto é, o herege, as arrebata para
si”.
Nosso santo não poupou sua palavra profética contra o clero
ganancioso e simonista, isto é, que ganhava dinheiro vendendo as coisas
sagradas. Antônio o chama de “outros filhos de Jacó” que venderam seu irmão,
José, por vinte moedas aos ismaelitas. Santo Antônio dizia: “Hoje José é Jesus
que continuais vendendo”.
A palavra de Santo Antônio tem força por causa do testemunho que
dá, e também porque a crítica que faz quer ser um apelo à conversão de todos
que estão errados. Assim sendo, Antônio acorda os de dentro da Igreja e os que
estão fora. A sua palavra profética denuncia todo mau exemplo, injustiça ou
opressão que comprometem o plano de Deus para a humanidade inteira. Para
Antônio a humanidade não possui a justiça de Deus “porque não O teme, desonra a
religião, odeia o bem, torna-se ingrato para com Deus...”
Todos são chamados à santidade. Para ele “os santos nasceram para
o bem do mundo porque a santidade é uma virtude que acaba beneficiando a
todos”.
Se vivemos em Cristo, nossa vida iluminada na Dele, é luz que
incomoda as trevas. Santo Antônio entendeu muito bem o que Jesus quis dizer
quando afirmou: “Vós sois o sal da terra... Vós sois a luz do mundo...” (Mt
5,13.14).
“Foi mestre da oração”
Santo Antônio foi mestre da oração para todos, mas em especial para as pessoas
simples com quem falava e partilhava sua missão de pregador do Evangelho. Por
isso, ao se referir à oração, ele afirma:
“Se alguém quiser rezar ou meditar melhor, procure então
representar para si em imagens claras a humanidade de Cristo, seu nascimento,
sua paixão e sua ressurreição!” E continua: “Esta maneira de meditar costuma
dar aos pobres em espírito e aos filhos de Deus mais simples uma felicidade
tanto maior no amor, quanto mais se aproximarem da humanidade Dele”.
Antônio está em sintonia com a espiritualidade de Francisco e de
Clara: de Francisco nasce o presépio para contemplar o mistério da encarnação,
e a via-sacra para meditar o mistério pascal do Senhor. Santa Clara, escrevendo
a uma de suas irmãs, Inês, pede que a cada manhã, contemple como num espelho a
vida de Cristo procurando assemelhar ao Seu rosto.
A oração franciscana é marcada pela simplicidade das palavras e a
riqueza das atitudes interiores e corporais. A simplicidade faz-nos falar com a
linguagem da vida, já a riqueza das atitudes interiores aparece no
reconhecimento de quanto somos pequenos diante da grandeza de Deus. Mas isso me
enche de alegria, de humildade e confiança que me leva a entregar-me plenamente
nas mãos de Deus. As atitudes corporais significam a sintonia com a natureza e
o reconhecimento de que a criação reza conosco.
Santo Antônio não nos deixou um método de oração, mas em suas
palavras encontramos muitas orientações concretas e seguras para buscarmos e
vivermos a intimidade com o Senhor: “O bom mestre nos convida para longe da
multidão inquieta: Vinde para a solidão do corpo e da alma”. Outra afirmação
interessante de nosso santo é: “A vida do corpo é a alma, a vida da alma é
Deus”.
Santo Antônio dizia: “Podemos rezar de três modos: com o coração,
com a boca e com as mãos”. Rezar “com o coração” com a atitude do verdadeiro
orante que reconhece diante de Deus sua pequenez, sua pobreza e reza na
humildade. Mas mesmo nesta condição nossa boca não pode calar quando o coração
sente a força da misericórdia de Deus e assim “a boca fala daquilo que o
coração está cheio”. E à semelhança da Samaritana, temos de dizer: “Venham ver
um homem que me disse tudo o que eu fiz” (Jo 4,29). Mas o coração que acolhe a
misericórdia e a boca que a proclama leva a pessoa a agir bem, como dizia o
próprio Jesus: “Que a vossa luz brilhe diante dos homens, para que vejam vossas
boas obras e louvem vosso Pai que está no céu” (Mt 5,16).
“Proclamou as maravilhas da Trindade”
Em Jesus entramos em comunhão com o mistério de Deus. Jesus nos
revela o rosto do Pai e nos dá o Espírito Santo. Em Deus não há solidão, mas
comunhão das Três divinas Pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo.
Santo Antônio proclamou com palavras belíssimas o mistério da
Santíssima Trindade: “Na Trindade se encontra a origem suprema de todas as
coisas e a beleza perfeitíssima e o deleite beatíssimo. A origem suprema é Deus
Pai, de quem procedem todas as coisas, de quem provêm o Filho e o Espírito
Santo. A beleza perfeitíssima é o Filho, verdade do Pai, que lhe não é
dessemelhante em ponto algum. O deleite beatíssimo e a soberana bondade é o
Espírito Santo, dom do Pai e do Filho”.
Nestas palavras encontramos o ensinamento da Igreja associado à
beleza e as comparações que Santo Antônio usava pala falar de mistério tão
grandioso. Noutro sermão, ele usa uma comparação com a palavra “paz”, em latim,
pax: “Na palavra PAX, há três letras e uma sílaba, em que se designa a Trindade
e a Unidade: no P, o Pai; no A, primeira letra, o filho, que é a voz do Pai; no
X, consoante dupla, o Espírito Santo, procedente de ambos. Assim, ao dizer
Jesus aos discípulos: 'A paz esteja convosco', recomenda a fé na Trindade e na
Unidade”.
Muitas vezes temos dificuldade de falar da Santíssima Trindade e
Santo Antônio numa linguagem comparativa, alegórica, fala com simplicidade do
mistério de Deus. Mas Antônio quer mostrar, sobretudo, as conseqüências de
nossa fé na Trindade Santa. A conseqüência fundamental para quem acredita da
Trindade é que nossa vida só tem sentido e só pode ser vivida em comunhão com
os outros, com a criação e com Deus. A beleza da vida está na comunhão e na
comunicação. É verdade que, na prática, tendemos à solidão e ao isolamento. Mas
vibra em nós a realidade de Deus, a verdade suprema que é não a solidão de uma
Pessoa, mas a comunhão e a comunicação das Três divinas Pessoas em um só Deus.
Santo Antônio afirma com beleza: “Na Trindade não se devem fazer
degraus, de modo que o Pai se creia maior que o Filho, ou o Filho menor que o
Pai, ou o Espírito Santo menor que ambos; mas deve-se acreditar que são
simplesmente iguais, porque qual é o Pai, tal é o Filho e tal é o Espírito
Santo”.
Pelo Batismo mergulhamos na vida da Trindade Santa e nos tornamos
instrumentos de unidade na diversidade.
“Senhor, a luz do teu rosto, a luz da graça que estabelece em nós
a tua imagem e nos torna semelhante a ti, está gravada em nós, impressa na
razão como selo em cera”.
“Anunciou o mistério da Encarnação do
Verbo”
“Ele veio a ti para poderes ir a Ele”. Essa afirmação é o centro
do pensamento e da espiritualidade de Santo Antônio. De fato, a espiritualidade
franciscana firma-se em duas colunas: a encarnação (Natal do Senhor) e a
redenção (Mistério Pascal). Santo Antônio reforça de modo muito próprio a
riqueza da espiritualidade de São Francisco e Santa Clara. Por isso podemos
falar em espiritualidade antoniana.
Santo Antônio nos mostra a bondade do Senhor que assumindo a condição humana,
no seio de Maria, trouxe-nos a salvação e nos habilitou como filhos de Deus:
“Para nós homens Te tornaste homem, a fim de nos salvar. Pelo que sofreste,
aprendeste a misericórdia. A nenhum anjo podemos dizer: Eis que és nosso osso e
nossa carne; mas a Ti, Filho de Deus, na verdade podemos dizer: És nosso osso e
nossa carne, pois assumiste não a natureza dos anjos, mas a natureza dos
descendentes de Abraão. Tem, pois, piedade de nós, que somos teu osso e tua
carne. Quem por acaso odiou sua carne? Tu, porém, és nosso irmão e nossa carne;
por isso deves ter misericórdia e compaixão com teus pobres irmãos, pois temos
um só Pai, Tu e nós – Tu pela natureza e nós pela graça. Tens poder na casa de
teu Pai, não nos expulseis daquela santa herança, um vez que somos na verdade
teu osso e tua carne. Antigamente os filhos de Israel transportaram os ossos de
José para a terra prometida; tira-nos também – teu osso e tua carne – destas
trevas do Egito e leva-nos para a terra dos santos”.
Antônio anuncia com entusiasmo e alegria o mistério da encarnação que é o
coração da fé cristã, pois nele se revela aquela iniciativa amorosa de Deus
descrita por São João da seguinte forma: “Nisto consiste o amor, não fomos nós
que amamos a Deus, mas foi ele que nos amou, e nos enviou o seu Filho como
vítima expiatória por nossos pecados” (1Jo 4,10).
Pela encarnação de Jesus no seio da Virgem Maria, Deus veio a nós para que nós
possamos ir até Ele. Neste ensinamento de Santo Antônio encontramos o próprio ensinamento
do Evangelho quando Jesus diz: “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém
vai ao Pai senão por mim” (Jo 14, 6).
“Amou a Virgem Maria”
Não temos certeza absoluta quanto a data do nascimento de Santo
Antônio, mas aqueles que procuraram escrever sua vida dizem que foi no dia 15
de agosto de 1195. Não estaria essa data relacionada ao amor que nosso santo
tinha à Mãe do Senhor. 15 de agosto é a solenidade da Assunção da Virgem Maria.
Não se pode negar a devoção que Santo Antônio tinha à Mãe de Jesus.
Dizem que ele faleceu com o nome de Maria nos lábios pois, desde criança
aprendeu a invocá-la e em toda sua vida foi-lhe profundamente devoto.
Encontramos seis sermões de Santo Antônio dedicado à Virgem Maria e neles a
homenageia com títulos admiráveis: “Trono místico de Cristo”, “Trono de marfim
pela sua brancura, ao qual se sobe pelos seis degraus das virtudes marianas:
vergonha, prudência, modéstia, constância, humildade e obediência”. Antônio
também compara Maria ao lírio, a um vaso de ouro, à oliveira, ao cipreste, ao
arco-íris e à porta do céu. Também à chama de nova Ester.
Santo Antônio tem afirmações profundas em que encontramos o
mistério da Virgem Maria sempre relacionado com o de Jesus Cristo: “A criatura
carregou no seio seu Criador e a pobre Virgem o Filho de Deus”. “Tu és ao mesmo
tempo o mais alto e o mais humilde! Senhor dos anjos e súdito dos homens! O
Criador do mundo obedece a um carpinteiro, o Deus de eterna majestade se
submete a uma Virgem”.
Outra afirmação interessante é esta: “Maria não só deve ser
louvada por ter trazido no ventre o Verbo de Deus, mas também é bem-aventurada
porque realmente guardou os preceitos de Deus”.
A reflexão que Santo Antônio faz sobre Nossa Senhora é
profundamente enraizada na bíblia, na pessoa de Jesus e na missão da Igreja.
De Santo Antônio temos muito o que aprender sobre o seu amor à Mãe
de Jesus.
“Tendo as numerosas virtudes brilhado de modo excelente em Maria Santíssima,
a humildade superou-as a todas. Por isso, quase esquecendo as restantes, coloca
à frente a humildade, dizendo: 'Olhou para a humildade de sua serva”.
Que o amor de Santo Antônio à Virgem Maria, Mãe de Jesus, nos
ajude a anunciar aquilo que a própria Maria proclamou no Magnificat: “Doravante
todas as gerações me chamarão bem-aventurada” (Lc 1,48).
“Viveu nesta vida construindo a eternidade”
“Para quem se fixa no desejo da eternidade nada há no mundo que deseje, nada há
do mundo que tema”. Estas palavras de Santo Antônio bem resumem o que foi sua
vida: a busca da eternidade vivida no dia-a-dia em sua vida e missão.
Ele soube aproveitar o tempo que Deus lhe concedeu e que foram
poucos, apenas 36 anos. E como diz o salmista, “Mil anos são aos teus olhos,
Senhor, como o dia de ontem que passou, uma vigília dentro da noite” (Sl 89,4).
A transitoriedade da vida vivida no desejo da eternidade fez
Antônio viver plenamente os seus dias para a glória de Deus e para a salvação
de muitos, pois, como ele mesmo dizia: “A santidade é uma virtude que acaba
beneficiando a todos”. E Antônio é o santo do mundo inteiro, apesar de sua ação
missionária está localizada quase toda na Itália, seu testemunho evangélico
ultrapassou não só o espaço geográfico, mas o tempo. Ainda hoje ele ilumina a
vida de quantos busquem Aquele que veio a nós para que possamos ir a Ele!
Seus últimos dias foram vividos num lugar de vida de oração dos
frades, um eremitério, em Camposanpiero, na zona rural, a uns dezoito
quilômetros de Pádua. Aproximava-se o verão e o clima em Camposampiero era mais
ameno, como também a tranqüilidade e a solidão para o encontro com Deus na
oração e na meditação. Era tarde demais para recuperar as forças e
restabelecer-se corporalmente. O seu sofrimento era grande com a hidropisia
(barriga d'água) e asma. Segundo pesquisas em suas biografias mais antigas, há
probabilidade de que nosso santo tivesse diabetes. O que sabemos é que não
poupou seu corpo, seu tempo e sua vida. Deu-se totalmente ao anúncio do
Evangelho.
Quando o quadro de sua saúde piorou, a seu pedido trouxeram-lhe
para Pádua. Os frades o trouxeram num carro puxado por dois bois. Fui uma
viagem longa e sofrida e que terminou em Arcella, na periferia de Pádua, na
tarde de 13 de junho de 1231.
Sua morte foi logo anunciada aos cidadãos de Pádua de modo
maravilhoso: sem que ninguém dissesse, as crianças de Pádua ficaram inquietas e
começaram a dizer pelas ruas: “Morreu o padre santo. Morreu o padre santo”.
Houve muita disputa no enterro, pois alguns queriam que fosse
enterrado onde morreu, em Arcella, outros no convento de Santa Maria, em Pádua. Mas finalmente,
foi sepultado em Pádua, numa terça-feira, 17 de junho de 1231.
Não demorou nem um ano para que fosse canonizado. Na festa de
Pentecostes, no dia 30 de maio de 1232, foi canonizado na catedral de Spoleto,
pelo papa Gregório IX. Pela sua vida a serviço da glória da Trindade Santa e da
salvação da humanidade, “ele mereceu ser colocado não debaixo do alqueire, mas
no candelabro da Igreja católica”, para que seu exemplo continue iluminado a
vida de todos.
Pensamentos de Santo Antônio:
“O paraíso é a primeira casa do homem”.
“Onde houver justiça, aí haverá sabedoria, e onde houver
sabedoria, aí está o paraíso”.
“O paraíso é a terra dos vivos, possuída pelos humildes”.
“Celebramos a festa dos santos para aprender com o exemplo de suas
vidas” e ainda, “os santos nasceram para o bem do mundo porque a santidade é
uma virtude que acaba beneficiando a todos”.
“A pobreza reveste a alma de virtudes, as riquezas temporais a
desnudam”.
“É raro o dano que não provenha da abundância”.
“A pobreza do filho de Deus foi tamanha, que na morte não teve
sudário em que fosse envolvido nem túmulo em que fosse sepultado, se não lhe
fossem dados, a titulo de misericórdia e de esmola, como se tratasse de pobre
mendigo”.
“Como o homem exterior vive do pão material, o homem interior se
alimenta do pão celeste, que é a Palavra de Deus”.
“Quem não ouve a Palavra de Deus e não observa a lei da caridade
queima em vão o incenso da oração”.
“A palavra é viva quando falam as obras. Cessem, pois, as palavras
e falem as obras. Estamos cheios de palavras mas vazios de obras!”
“Escuta como a Escritura consola o que padece tribulação: Quando
tu passares pela água, eu estarei contigo e os rios não te cobrirão. Quando
caminhares por entre o fogo, não serás queimado e a chama não arderá em ti,
porque eu sou o Senhor teu Deus”.
“Assim como no favo há mel e cera, também na vida do homem justo
há o mel da doçura interior e a cera da adversidade. A cera funde-se e
desaparece na presença do fogo, na presença do amor divino”.
“Toda obra boa toma seu princípio na humildade”.
“A humildade é a mais nobre de todas as virtudes”
“A casa compreende alicerces, paredes e teto. Os alicerces
simbolizam a humildade; as paredes o conjunto das virtudes: o teto a caridade.
Onde estes três elementos se encontram reunidos, aí está o Senhor”.
“A pregação deve ser sólida, isto é, rica da plenitude das boas
obras, propondo palavras verdadeiras, não frívolas, não apenas bonitas”.
“A pregação deve ser reta, não vá o pregador desfazer em suas
obras o que disse no sermão. De fato, perde-se a autoridade de falar, quando a
palavra não é ajudada pelas obras”.
“O estrume reunido em casa exala mau cheiro; disperso, fecunda a
terra. Assim acontece com as riquezas: devem ser dispersas, isto é,
distribuídas e restituídas aos pobres, que são seus donos, e assim hão de
fecundar a terra do espírito e fazê-la frutificar”.
“Só te pertence o que podes levar contigo na morte”.
“Como o ouro está acima de todos os metais, assim a ciência
sagrada sobressai a toda ciência”.
“A vida contemplativa não foi instituída por causa da ativa, mas a
vida ativa por causa da contemplativa”.
“Também o corpo tem seus profetas que lhe dizem: 'Para que serve o
teu jejuar? Para que toda essa tortura? Vais adoecer; tornar-te-ás tão fraco
que não poderás ser útil nem a ti nem aos outros'. Entretanto, a respeito
desses videntes está escrito: 'Teus profetas anunciam a ti mentiras e engano”.
“Assim se tornam algumas pessoas, que antes de entrar para o
convento viviam em casa de modo simples, mas apenas entraram para o convento
começam a mostrar-se cheias de exigências. Esses tais não têm sua alegria na
oração, mas na ociosidade e na preguiça... Viso àqueles que moram na igreja de
Deus, mas vivem na ociosidade e no relaxamento, que em vez do silêncio da
oração procuram a tagarelice e a conversa dos ociosos”.
“A doutrina de Cristo parece dura, porque ensina a dominar o corpo
e desprezar o mundo. Por isso não se gosta de escutá-la”.
“Praticar uma boa obra é orar sem interrupção”.
“Somos templos de Deus e santos, se formos contemplativos,
renunciando aos bens temporais; se mortificarmos nossa carne; se nos
compadecermos do próximo”.
“O Espírito Santo é enviado pelo Pai e pelo Filho. Os três são de
uma só substância e de inseparável igualdade. A unidade está na essência; a
pluralidade nas pessoas”.
“Assim como a moeda se cunha com a imagem do rei, também nossa
alma é gravada com a imagem da Santíssima Trindade”.
“Bem-aventurado o ventre da gloriosa Virgem, que mereceu trazer
por nove meses todo o bem, o sumo bem, a felicidade dos anjos, a reconciliação
dos pecadores”.
“Cristo na verdade veio em nosso socorro ao dar-nos sua divindade
e aceitar nossa humanidade, para que pudéssemos ser aceitos no reino de Deus,
uma vez que dele estávamos excluídos. Para que tivéssemos acesso ao céu, ele o
deixou”.
“Porque o homem estendeu sua mão para apossar-se da glória da
majestade divina, Deus se desfez da sua poderosa glória e na sua humildade se
acomodou ao homem”.
“Alma de santo algum reuniu tantas riquezas de virtudes como a de
Maria Santíssima. Por causa da insígnia da sua humildade, da flor ilesa da sua
virgindade, mereceu conceber e dar à luz o Filho de Deus”.
“Maria é a estrela do mar. Ela é a estrela deslumbrante, que
ilumina a noite e guia ao porto”.
“Maria: nome amável aos anjos, terrível aos demônios, salutar aos
pecadores, suave aos justos”.
“Maria Santíssima ao dar a luz o Filho de Deus o envolveu em
paninhos da áurea pobreza. Ó ouro ótimo da pobreza! Quem não te possui, ainda
que possua todas as coisas, nada possui”.