CELIBATO
A graça de ser só.
Ando pensando no valor de ser só. Talvez seja
por causa da grande polêmica que envolveu a
vida celibatária nos últimos dias. Interessante
como as pessoas ficam querendo arrumar
esposas para os padres.
Lutam, mesmo que não as tenhamos convocado
para tal, para que recebamos o direito de nos
casar e constituir família.
Já presenciei discursos inflamados de pessoas
que acham um absurdo o fato de padre não
poder casar.
Eu também fico indignado, mas de outro modo. Fico
indignado quando a sociedade interpreta a vida
celibatária como mera restrição da vida sexual.
Fico indignado quando vejo as pessoas
se perderem em argumentos rasos,
limitando uma questão tão complexa ao
contexto do “pode ou não pode”.
A sexualidade é apenas um detalhe da questão.
Castidade é muito mais. Castidade é um elemento
que favorece a solidão frutuosa, pois nos coloca
diante da possibilidade de fazer da vida uma
experiência de doação plena. Digo por mim.
Eu não poderia ser um homem casado e levar a
vida que levo. Não poderia privar os meus filhos de
minha presença para fazer as escolhas que faço.
O fato de não me casar não me priva do amor.
Eu o descubro de outros modos. Tenho diante de
mim a possibilidade de ser dos que precisam de
minha presença. Na palavra que digo, na música
que canto e no gesto que realizo, o todo de
minha condição humana está colocado. É o que
tento viver.
É o que acredito ser o certo.
Nunca encarei o celibato como restrição. Esta opção de vida não
me foi imposta. Ninguém me obrigou ser padre, e quando
escolhi o ser, ninguém me enganou.
Eu assumi livremente todas as possibilidades do meu ministério,
mas também todos os limites.
Não há escolhas humanas que só nos trarão possibilidades.
Tudo é tecido a partir dos avessos e dos direitos.
É questão de maturidade.
Eu não sou um homem solitário, apenas escolhi ser só.
Não vivo lamentando o fato de não me casar. Ao contrário,
sou muito feliz sendo quem eu sou e fazendo o que faço.
Tenho meus limites, minhas lutas cotidianas para manter a
minha fidelidade, mas não faço desta luta uma experiência de
lamento. Já caí inúmeras vezes ao longo de minha vida.
Não tenho medo das minhas quedas. Elas me humanizaram e
me ajudaram a compreender o significado da misericórdia.
Eu não sou teórico. Vivo na carne a necessidade de estar em
Deus para que minhas esperanças continuem vivas.
Eu não sou por
acaso.
Sou fruto de um
processo histórico
que me faz
perceber as
pessoas que posso
trazer para dentro
do meu coração.
Deus me mostra. Ele me indica, por meio de minha
sensibilidade, quais são as pessoas que poderão
oferecer algum risco para minha castidade.
Eu não me refiro somente ao perigo da sexualidade.
Eu me refiro também às pessoas que querem me
transformar em “propriedade privada”.
Querem depositar sobre mim o seu universo de carências
e necessidades, iludidas de que eu sou o redentor de suas
vidas.
Contra a castidade de um padre se peca de diversas
formas. É preciso pensar sobre isso. Não se trata de casar
ou não. Casamento não resolve os problemas do mundo.
Nem sempre o casamento acaba com a
solidão. Vejo casais em locais públicos em
profundo estado de solidão. Não trocam
palavras, nem olhares. Não descobriram a
beleza dos detalhes que a castidade sugere.
Fizeram sexo demais, mas amaram de menos.
Faltou castidade, encontro frutuoso, amor
que não carece de sexo o tempo todo, porque
sobrevive de outras formas de carinho.
É por isso que eu continuo aqui, lutando pelo direito de
ser só, sem que isso pareça neurose ou imposição que
alguém me fez.
Da mesma forma que eu continuo lutando para que os
casais descubram que o casamento também não é uma
imposição. Só se casa aquele que quer.
Por isso perguntamos sempre – É de livre e espontânea vontade que o
fazeis? – É simples. Castos ou casados, ninguém está livre das obrigações
do amor. A fidelidade é o rosto mais sincero de nossas predileções.
A graça desça sobre cada um de vocês, meus filhos!
Que Deus lhes abençoe em nome do Pai, do Filho
e do Espírito Santo AMÉM!
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