sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Atraso no TSE adia análise da Ficha Limpa pelo STF


O descumprimento de prazos pelo Tribunal Superior Eleitoral está atrasando o julgamento da constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar 135/10) pelo Supremo Tribunal Federal. É o que sustentam os advogados do candidato Francisco das Chagas Rodrigues Alves (PSB), que concorre a uma vaga de deputado estadual na Assembléia Legislativa do Ceará.
Os advogados Alberto Pavie Ribeiro, Emiliano Alves Aguiar e Pedro Gordilho, que representam o candidato a deputado estadual, entraram com Reclamação no STF, na segunda-feira (6/9). Eles sustentam que há um “atraso injustificável” do tribunal eleitoral em cumprir os trâmites necessários para que o recurso do político seja remetido ao Supremo.
O julgamento no qual o TSE barrou a candidatura de Francisco das Chagas foi o primeiro caso concreto em que se discutiu a aplicação da Lei da Ficha Limpa. Na Reclamação ao STF, os advogados reclamam de atraso na lavratura do acórdão, “que apesar de ter sido publicado na sessão de 25 de agosto, encontra-se disponível até o momento apenas sob o formato de ‘mídia’, não tendo a maior parte dos ministros liberado seus votos”.
De acordo com a defesa, “o atraso na lavratura do acórdão repercutirá, necessariamente, no processamento do recurso extraordinário”. Isso porque é necessário que sejam transcritos os votos e os debates para que Supremo receba o recurso e inicie os atos para seu julgamento.
A defesa também aponta “omissão em relação à prolação dos despacho de admissibilidade” do Recurso Extraordinário ao Supremo Tribunal Federal. Segundo os advogados, o TSE descumpre o prazo previsto no parágrafo 1º do artigo 281 da Lei Eleitoral. De acordo com o dispositivo, “juntada a petição nas 48 (quarenta e oito) horas seguintes, os autos serão conclusos ao Presidente do Tribunal, que, no mesmo prazo, proferirá despacho fundamentado, admitindo ou não o recurso”.
O procedimento de um recurso é o seguinte: quando a parte perdedora recorre da decisão, o recurso é apresentado ao próprio tribunal que lhe impôs a derrota. E este tribunal determina ou não a subida do recurso para a instância superior. No caso dos recursos contra decisões do TSE, só cabe a análise pelo STF, e apenas quando há questão constitucional envolvida. No caso da Lei da Ficha Limpa, não há dúvidas de que há discussão de cunho constitucional. Por isso, os advogados esperam que o TSE envie seu recurso ao Supremo.
Segundo a defesa, o prazo para que a presidência do TSE mandasse o recurso acabou no dia 2 de setembro, às 16h53, já que ele foi apresentado no dia 31 de agosto, às 16h52. “Passados já seis dias, portanto, muito mais do que 24 horas, não pode o reclamante prever em quanto tempo mais haverá a presidência do TSE de proferir o exame de admissibilidade do recurso e remeter os autos para esse STF, ainda mais diante da primeira consideração de que tal envio somente se dará depois de lavrado o acórdão”, sustentam. Ainda não foi sorteado relator da Reclamação no Supremo, o que deve ocorrer nesta quarta-feira (8/9).
Tema complexoO TSE informa que o recurso chegou à presidência daquele tribunal em 1º de setembro e que ainda não teve sua admissibilidade julgada por se tratar de questão complexa.
Segundo o secretário-geral da presidência, Manoel Carlos de Almeida Neto, “o recurso extraordinário interposto no RO 433.627/CE aportou recentemente na Secretaria-Geral da Presidência, mais precisamente às 17h do dia 31 de agosto e foi encaminhado ao presidente em 1º de setembro para decisão. Esse é o primeiro recurso extraordinário que versa sobre a Lei da Ficha Limpa e, também, o único que chegou à presidência até este momento. Diante da relevância e complexidade da matéria e, também, da inexistência de precedentes específicos sobre a LC 135/2010, o presidente do TSE, ministro Ricardo Lewandowski está examinando cuidadosamente a questão”.
A presidência do TSE não se pronunciou em relação à lavratura do acórdão. Na inicial, os advogados afirmam que os ministros Ricardo Lewandowski e o relator designado para o acórdão, Arnaldo Versiani, já liberaram seus votos. Mas faltam os votos dos demais ministros. Assessores informam, contudo, que as notas taquigráficas do julgamento já foram liberadas pela secretaria judiciária e que elas bastariam para a interposição do recurso.
Independentemente da data, os recursos contra as decisões do TSE no que se refere à aplicação da Lei da Ficha Limpa têm um encontro marcado com o Supremo. Os mesmos advogados representam o candidato ao governo do Distrito Federal Joaquim Roriz e também entraram no Supremo com Reclamação contra a decisão do TSE de barrar a candidatura do ex-governador distrital.
Neste caso, a defesa de Roriz pede o deferimento do registro de sua candidatura ou uma nova análise do recurso pelo tribunal eleitoral, sem considerar a aplicação da Lei da Ficha Limpa. Eles sustentam que a aplicação imediata da nova lei fere diversas decisões já tomadas em outras ações pelo STF.
Mesmo com três sessões semanais e plantões ininterruptos no período que antecede as eleições, o TSE, historicamente, enfrenta problemas para cumprir os apertados prazos previstos pela Lei Eleitoral. Na composição passada do tribunal, por exemplo, recursos contra expedição de diploma foram julgados depois que os governadores estavam empossados e já tinham cumprido mais da metade dos mandatos. O processo que cassou o mandato do governador Jackson Lago, no Maranhão, foi um exemplo.
O problema se repete em toda a Justiça Eleitoral. Há dezenas de recursos contra registros com base na Lei da Ficha Limpa que ainda não foram analisados sequer pelos tribunais regionais eleitorais.
Validade da lei
No julgamento em que o registro da candidatura de Francisco das Chagas foi rejeitado o TSE decidiu que as exigências da Lei Complementar 135/10, chamada Lei da Ficha Limpa, se aplicam imediatamente e seus efeitos se estendem aos candidatos condenados por órgãos colegiados mesmo antes de a norma entrar em vigor.
Por cinco votos a dois, duas teses prevaleceram. A primeira foi a de que a lei não altera o processo eleitoral e, por isso, não precisa aguardar o prazo constitucional de um ano para ser aplicada. A segunda foi a de que critérios de inelegibilidade não podem ser enquadrados como punição ou pena. São condições exigidas para o registro de candidatos. E essas condições devem ser aferidas no momento do pedido de registro da candidatura.
O raciocínio para determinar que critério de inelegibilidade não é pena. É o seguinte: Dona Marisa, mulher do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não pode concorrer. E isso não pode ser enquadrado como punição. É uma vedação de cunho eleitoral estabelecida em lei.
Outro exemplo: para se candidatar, juízes têm de pedir exoneração do cargo. E não se pode afirmar que isso é uma pena. O mesmo raciocínio se aplicaria para os novos critérios criados para barrar candidaturas. Logo, não há espaço para se falar em violação ao princípio de que a lei não pode retroagir para prejudicar o réu.
O ministro Marcelo Ribeiro, contudo, separa as causas de inelegibilidade de duas formas. Para ele, elas podem ter, ou não, caráter de sanção. De acordo com o entendimento de Ribeiro, se a inelegibilidade decorre da prática de um ilícito eleitoral, ela revela caráter de pena porque é imposta em razão da prática do ilícito. Logo, não poderia haver a retroatividade para prejudicar o candidato. Já as causas de inelegibilidade decorrentes de parentesco ou por ocupação de cargo público não são tidas como sanção. Assim, para essas, especificamente, não cabe falar de retroatividade.
Para fundamentar a aplicação imediata da lei, os ministros entenderam que ela não se enquadra no princípio da anualidade previsto no artigo 16 da Constituição Federal. De acordo com o artigo, “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”.
Como a Lei da Ficha Limpa foi sancionada em junho, há apenas quatro meses das eleições, não poderia barrar candidaturas antes de junho de 2011. Na prática, seria aplicada apenas para as eleições de 2012. Mas apenas os ministros Marco Aurélio e Marcelo Ribeiro entenderam que estabelecer novos critérios de inelegibilidade altera o processo eleitoral.
Para o presidente do TSE, ministro Ricardo Lewandowski, o prazo de um ano para a aplicação de lei só se justifica nos casos em que há deformação do processo eleitoral. Ou seja, nos casos em que desequilibra a disputa, beneficiando ou prejudicando determinadas candidaturas.
Como a Lei da Ficha Limpa é linear, ou seja, se aplica para todos indistintamente, não se pode afirmar que ele interfere no processo eleitoral. Logo, sua aplicação é imediata.
Leia aqui a íntegra da reclamação do candidato

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